Em nossa pesquisa sobre o Panteão do Brasil, localizado na Praça dos Três Poderes, em Brasília, refletimos sobre esse singular monumento e sobre o universo de debates que o estudo do Panteão possibilita. O monumento registra a história das disputas políticas e parlamentares, acerca das celebrações oficiais da História e da memória nacional, na busca pelo acionamento de uma identidade nacional, por meio dos sentimentos de unidade, pertencimento e comunidade. No recorte deste trabalho propomos um debate mais específico, voltado ao questionamento da própria “tipologia” do monumento do Panteão Nacional Contemporâneo. A abordagem deriva da observação de Walter Benjamin (1994) de que “nunca houve um monumento de cultura que não fosse também um monumento de barbárie”. Uma vez que Marx e Engels apontam, na Ideologia Alemã (2008), que “as ideais da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes”, a observação de Benjamin parece denunciar justamente os “horrores” sobre o qual se assentam esses monumentos da cultura, logo da classe, “dominante”. Visto que o Panteão Contemporâneo surge no contexto da Revolução Francesa, observamos como os “homens da revolução”, os “vitoriosos” daquele tempo, promoveram a construção de um novo altar, voltado a celebrar o triunfo do indivíduo, da meritocracia, do pensamento liberal, da burguesia e da propriedade. Buscamos observar as influências e marcas dessas raízes do projeto do Panteão Contemporâneo na atualidade, e em especial no Panteão do Brasil. Com a escolha dessa metodologia, analisaremos o Panteão a partir do binômio: 1- “Monumento de Cultura”, pensando a proposta e atuação do Panteão, além das disputas parlamentares, assim como os embates e as tensões ideológicas, que observamos ao analisarmos o monumento gerido e operado pelo Estado. 2- “Monumento de Barbárie”: os “sinais” da barbárie do monumento são perceptíveis nas tensões e contradições internas do monumento, ao pensarmos nos processos de tensões e apaziguamentos e nas difíceis convivência de narrativas, ideologias e personagens nos Panteões nacionais. Sem esquecer de como o monumento favorece a homenagem de figuras do poder, ou mesmo conservadoras, em comparação com a entrada, através de uma hercúlea luta política, de novos sujeitos (de mulheres, negros e indígenas, por exemplo). Porém, além dessas questões “internas”, que variam de panteão para panteão, as marcas dessa “barbárie” estão também nas raízes e na fundação do conceito do monumento do Panteão Nacional Contemporâneo. Passado o momento iconoclasta, e derrubadas as estátuas dos reis e dos religiosos, a Revolução Francesa buscou levantar “novos altares”. Assim surgiu esse sui generis monumento, voltado a uma minoria de eleitos divinizados, que cala fundo frente à História não celebrada, nem monumentalizada, e por muitas vezes sequer contada, dos comuns, das maiorias, dos desvalidos, dos marginalizados. Assim observamos essa dupla-característica dos monumentos, cultura-barbárie, proposta por Benjamin, pois como afirma o autor tais monumentos devem sua existência “não somente ao esforço dos grandes gênios que os criaram, como à corveia anônima dos seus contemporâneos”. Não deixa de chamar a atenção que a luta política-parlamentar pela democratização do monumento, deve manter-se atenta às “armadilhas” e aos limites do Panteão Contemporâneo.
Palavras-chave: Memória. Identidades. Monumentos. Comemoracionismos. Nacionalismos.