Apresento neste trabalho alguns desdobramentos dos estudos que venho desenvolvendo no mestrado profissional em Ensino de História. Considerando que lido com dois espaços formativos que, a rigor, ocupam lugares antagônicos na construção de saberes e nas pretensões dos seus usos, a Escola e o Terreiro, busco debater possibilidades de aproximação entre estes dois modelos formativos. É importante destacar que apesar dos avanços obtidos a partir da promulgação da Lei 10.639/2003, grande conquista de anos de luta dos movimentos negros brasileiros, ainda existem muitos desafios na implementação da referida lei no cotidiano escolar. Um desses desafios é a maneira pela qual o ensino de História da África e dos povos africanos bem como o de Cultura Afrobrasileira tem sido abordado na Escola. Como então tratar das experiências dessas populações sem cair em exotismos ou naquilo que Leandro Bulhões chamou de “paradigma da contribuição” (BULHÕES, 2018), ou seja, a noção reducionista de que a participação de negras e negros na formação do Brasil, bem como dos povos originários, estaria restrita a aspectos folclorizados que são acionados pontualmente em eventos escolares, como a Semana da Consciência Negra, por exemplo? A solução desta problemática passa, necessariamente, pela compreensão de que os povos afro diaspóricos brasileiros elaboram, cada um em seu contexto, diversas maneiras de compreender, elaborar e operar suas realidades. Assim, construo nesse trabalho, uma ponte entre o Terreiro, compreendido aqui como espaço de organização social, cultural e política, a partir da ancestralidade e das tradições religiosas afro diaspóricas no Brasil em particular os Terreiros de Candomblé Ketu, e a Escola. No contexto brasileiro, marcado pela violência colonial, os terreiros de Candomblé são lugares fundamentais na preservação de modos de vida dos povos afro-diaspóricos. São espaços de manutenção de cosmopercepções, sensibilidades, línguas, mas também lugares de recriação, de adaptação e criatividade. São, ao fim e ao cabo, resultado de um imenso esforço histórico de pessoas africanas e suas descendentes para não perderem seus mundos originários por inteiro (BOTELHO; NASCIMENTO, 2020). A escola, apesar das problemáticas supracitadas, ainda é um importante espaço de formação, se ela é uma das grandes responsáveis pelo aprofundamento dos abismos sociais que marcam a sociedade brasileira também é lá que esse abismo pode ser reduzido (SANTOS, 2015). Proponho então um cruzamento entre os métodos formativos embasados nas epistemologias de terreiro, que observam a ancestralidade, a memória, a corporeidade e a musicalidade como elementos constitutivos do processo de ensino aprendizagem, e os processos de formação escolar. Destaco também, por fim, que a construção de pontes entre os terreiros de Candomblé e a escola se orientam não por uma noção de proselitismo religioso, mas pelo entendimento de que os saberes escolares que se pretendem antirracistas, mais que olhar de maneira distante para as tradições e saberes dos povos afrodiaspóricos, necessita enxergar neles valor epistêmico, interpretações de mundo e propostas de intervenções sociais concretas na sociedade, articulando assim a construção de um Ensino de História e um ambiente escolar antirracista e transformador.
Palavras-chave: Ensino de História. Candomblé. Educação Antirracista.