O presente trabalho é resultado da tese de doutorado defendida na Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz, em 2023. O Cytotec, nome comercial do Misoprostol, foi inserido no mercado farmacêutico brasileiro em 1986 com indicação para o tratamento de úlceras gástricas e venda livre sem exigência de receituário médico. Logo nos primeiros anos de comercialização, o uso da substância para a prática abortiva foi denunciado pelo campo farmacêutico e persistentemente explorado pela mídia. No debate em torno do uso do medicamento para a prática ilegal do aborto, diferentes discursos foram mobilizados favoravelmente e contrariamente ao medicamento. Por um lado, ginecologistas e obstetras demonstravam que entre os métodos utilizados por mulheres para abortar, o Misoprostol se apresentava como menos danoso à saúde da mulher sendo, dessa forma, uma ferramenta para diminuir a mortalidade materna decorrente do aborto inseguro. Assim, os profissionais desse campo alegavam a importância da disponibilidade do medicamento para a saúde pública como forma de diminuir os danos à saúde das mulheres e melhorar os dados da saúde pública com relação à mortalidade materna. Na contramão dessa visão, profissionais dos campos farmacêutico e da medicina genética apontaram para o risco de malformação congênita dos bebês associado ao uso considerado indevido do medicamento. Essa controvérsia ultrapassou o campo científico e se fez presente na mídia nacional, mobilizando a atenção pública em torno da proibição da comercialização que ocorreu progressivamente a partir de 1991 tendo como ápice de medidas restritivas o enquadramento na regulamentação de substâncias especiais em 1998. Para a realização desta pesquisa diversas fontes foram utilizadas, sendo algumas delas: revistas científicas e artigos publicados a respeito do Cytotec; jornais de circulação nacional, como Jornal do Brasil, O Globo, O Estado de São Paulo; revistas de circulação nacional tais como Veja e Manchete; processo jurídico de proibição da venda, entre outras.
Palavras-chave: Cytotec. Aborto medicamentoso. Mulheres. Normatização. Ciência.