A comunicação é um esforço de observar como Frei Daniel Samarate, pertencente à ordem dos capuchinhos, registrou seu adoecimento e internação no Asilo do Tucunduba, na cidade de Belém-Pará, no século XX. Para tanto, procedeu-se de uma ampla análise do diário em consonância com jornais da época para compreender o sujeito que vai ao consultório na condição de doente, com suas dúvidas, certezas e hipóteses sobre os sinais que o corpo expressava. Cada dia registrado no diário com uma data cronológica e o dia correspondente da semana indica como a doença foi sentida dentro de múltiplas temporalidades, seja pelo dia registrado, das lembranças retomadas de sua trajetória eclesiástica ou mesmo da falta de expectativa diante da angústia de não ter uma cura. Entende-se o tempo nessa pesquisa enquanto uma construção cultural, como sugere Reinhart Koselleck, tendo em vista que as experiências temporais da doença se imbricam e dentro da metáfora dos estratos do tempo “remetem a diversos planos, com durações diferentes e origens distintas, mas que, apesar disso, estão presentes e atuam simultaneamente”. Sua escrita construiu uma narrativa do doente sobre a lepra, trilhando os indícios para a descoberta, a negação e posteriormente o cotidiano de um enfermo em um asilo. Mesmo sendo um espaço de registro de suas atividades devocionais, o diário foi sorrateiramente contando uma rotina dinâmica, porém também solitária e receosa diante dos sintomas que desacelerava a vida de Frei Daniel Samarate. A escrita do religioso insere-se no universo das letras que sem dúvida exerceu relações de poder em vários espaços, seja no asilo do Tucunduba e por que não na cidade de Belém, pois seu diário vai além de uma escrita de si, já que carrega consigo experiências coletivas, de convivência em um leprosário carregado de tensões e sociabilidades, que foram descritas a partir dos múltiplos olhares de um frei leproso, que tinha um lugar de fala.
Palavras-chave: Diário. Lepra. Tempo.