Aventuras do violeiro de Évora nos trópicos: uma análise de Sodomita (2023), de Alexandre Vidal Porto

Autor(a) principal: Everson Nicolau de Almeida
Co-autor(a): Roberta Guimarães Franco

Esta proposta de comunicação tem por objetivo realizar uma análise literária da obra “Sodomita” (2023), de autoria de Alexandre Vidal Porto, com o intuito de perscrutar como o escritor maneja as lacunas deixadas pela história para erigir uma ficção que entrelaça temáticas como gênero e sexualidade. A narrativa analisada se desvela no século XVII, em Portugal, período em que a homossexualidade se encontrava sob o estigma da criminalização, resultando em penas severas, incluindo o degredo para as terras além-mar. No enredo, Luiz Delgado, o protagonista, é desterrado para o Brasil após ser sentenciado por sodomia, termo utilizado na época para denotar a homossexualidade, revelando as normas sociais vigentes e as representações da sexualidade. Nesse sentido, intentamos explorar de modo comparado o conceito de metaficção historiográfica, cunhado por Linda Hutcheon (1991) na obra “Sodomita”, a fim de investigar como o autor se utiliza da ficcionalização da história para tecer uma narrativa que se alicerce em eventos factuais, ao mesmo tempo em que interpela e subverte as convenções históricas. Na tessitura de “Sodomita”, a ficção desempenha um papel marcante na construção da figura do protagonista, Luiz Delgado, violeiro de Évora, cuja trajetória é imbuída de nuances e ambiguidades. Deportado para o Brasil após enfrentar acusações de sodomia no velho continente, Delgado emerge como uma personagem complexa, cuja identidade se constrói em meio às vicissitudes da condenação e do desterro. Alexandre Vidal Porto habilmente utiliza a narrativa ficcional para explorar as camadas da biografia de Delgado, apresentando-o não apenas como vítima das normas sociais repressivas, mas também como um indivíduo cujas escolhas desafiam as expectativas convencionais. Mesmo após a condenação na metrópole, Delgado ressurge na colônia envolvido em relacionamentos considerados nefandos, desafiando assim a noção de reabilitação imposta pela sociedade da época. Através da lente da ficção, o autor estabelece uma reflexão sobre a natureza da identidade social e da sexualidade, desafiando estigmas históricos e oferecendo ao protagonista um espaço para complexidade e redenção diante das persistentes acusações de sodomia incorrigível. Ademais, este estudo entrelaça as perspectivas dos historiadores Luiz Mott (2010) e Ronaldo Vainfas (2010), notáveis por suas contribuições nos estudos historiográficos no que tange à perspectiva de análise do papel desempenhado pelo Santo Ofício na repressão às sexualidades dissidentes das normas convencionais, sobretudo no contexto do período colonial brasileiro. Suas pesquisas servirão como faróis relevantes para a análise da trama de Vidal Porto, com vistas a estabelecer um paralelo entre as indagações historiográficas e a tessitura da ficção por meio da linguagem e dos recursos estéticos que conformam o romance. Deste modo, exploraremos as conexões entre a ficção literária e a pesquisa histórica, salientando como o autor recorre à ficção para preencher as lacunas da história e dar voz às experiências frequentemente negligenciadas ou reprimidas. Por meio desta análise interdisciplinar, buscamos arrojar luz sobre como a literatura contemporânea pode ser uma valiosa ferramenta para explorar questões históricas e sociais complexas, assim como fomentar discussões acerca de identidade, sexualidade e poder, tanto no contexto do século XVII quanto nos dias atuais.

 Palavras-chave: Literatura. História. Inquisição. Sexualidade.