A segunda metade do século XVII foi marcada, em Portugal e nos seus domínios ultramarinos, por uma crescente reordenação político-administrativa na esteira da Restauração (1640) e das últimas guerras de expulsão dos holandeses da América Portuguesa (1654). A recomposição e consequente ampliação de ofícios ligados à conquista e administração do território colonial aconteceu em meio a disputas de toda ordem – por maiores remunerações, localização mais central no império, cargos hierarquicamente mais altos etc. Diante do avanço promovido pelos colonizadores em direção aos domínios espanhóis durante o período da União Ibérica, entrou cada vez mais na pauta das políticas coloniais promovidas pela Coroa Portuguesa o avanço e a consolidação do empreendimento colonial nas zonas de fronteira. O objetivo desta comunicação é analisar a disputa pela jurisdição sobre a capitania do Ceará, àquela altura uma fronteira aberta, travada entre governadores do Estado do Maranhão e capitães-mores de Pernambuco. É necessário pontuar que àquela altura o Ceará sequer possuía uma vila, isto é, não tinha Câmara. O principal núcleo de povoamento ficava no entorno da mal-acabada fortaleza construída próxima ao riacho Pajeú. Ao contrário da vizinha capitania do Rio Grande, que em 1701 foi “anexada” à Pernambuco por determinação do rei, não há para o Ceará um documento que indique o mesmo procedimento. Interessou-nos nesta pesquisa, analisar os debates que saltam aos olhos na comunicação (cartas, memórias, instruções) entre governadores e capitães-mores ao longo da segunda metade dos seiscentos, tendo como objeto a jurisdição sobre boa parte dos sertões e cuja consequência foi o estabelecimento da fronteira interna da América Portuguesa entre Estado do Brasil e Estado do Maranhão. Observamos que apesar de pouco conhecidos, os “sertões do Ceará” foram objeto de disputa por parte de agentes coloniais do Maranhão, que alegavam primazia baseados na anexação do Ceará quando da criação do Estado do Maranhão, e de Pernambuco que alegavam incapacidade do governo do Maranhão em socorrer o Ceará. No meio disso, os capitães-mores do Ceará sofriam todo tipo de ingerência – de ambos os lados, vale dizer. Por fim, destacamos na pesquisa que a conjuntura de recrudescimento das guerras de conquista contra os indígenas pesou em favor de um dos lados, embora ao longo do século XVIII, pontualmente, governantes de ambos os lados voltassem à carga e quisessem reviver as disputas de jurisdição.
Palavras-chave: Fronteira. Jurisdição. Sertões do Norte.