No regime catedrático, o império da cultura machista estruturou barreiras que aniquilaram e/ou constrangeram o desenvolvimento da carreira de mulheres, neste caso, de historiadoras. A dominação masculina sancionava não apenas as figuras, mas as virtudes epistêmicas (características virtuosas, modelos de conduta) que caracterizavam o ethos de um historiador(a). Na divisão sexual do trabalho historiográfico, critérios distintos marcaram não apenas as relações de poder, mas estruturaram uma nova disposição ética do trabalho intelectual feminino. Com isso, pretendemos demonstrar como a gestão do tempo, o acúmulo de postos de trabalho e a ampla profusão de publicações constituíram as vias de acesso de mulheres ao universo acadêmico da época. Na interação entre as virtudes incorporadas e as estratégias articuladas, apresentaremos uma fração ainda pouco explorada da trajetória de Emília Viotti da Costa, que representou um contexto fundamental na conversão da carreira da historiadora. Referimo-nos ao exercício do cargo de assistente e professora nas disciplinas meta-
históricas (definimos assim, as disciplinas de Introdução aos Estudos Históricos, Teoria e Metodologia da História) na Universidade de São Paulo entre 1957-1968. Apesar de “periféricas” na hierarquia do curso de História, as disciplinas se tornaram um espaço privilegiado para que ela validasse predicados teóricos e metodológicos, experiência central para o desenvolvimento do seu doutorado (que se desdobrou na sua livre docência em 1964). Por meio da análise do arquivo institucional da historiadora (disponível no Arquivo Geral da USP) foi possível analisar os relatórios das disciplinas, mapear as mudanças de regimes de contratação, levantar o currículo de publicações, entre outras fontes. À luz das reflexões propostas, buscaremos apresentar as virtudes legitimadas e consagradas pelos historiadores no concurso de livre docência de Emília Viotti da Costa em 1964.
Palavras-chave: História Social de Gênero. História Intelectual. História da Historiografia.