O tema central deste trabalho é a disputa e legitimidade das narrativas e memórias testemunhais sobre regimes ditatoriais da América Latina no século XX através das escritas, edições, reedições e leituras de autobiografias. Assim, problematiza-se a elaboração do passado através de autobiografias, sobre como essas elaborações articulam diversas relações com a “verdade”, com a “ficção”, com a “história”, com o “presente”, com as sociedades onde foram escritas e lidas. Este também é um trabalho sobre uma contradição na produção de memória do nosso recorte: no Brasil da segunda década do século XXI, “lemos” um panorama conflituoso quando nos debruçamos sobre as narrativas das ditaduras. Por um aspecto, temos avanços significativos na abertura de arquivos relacionados à produção documental oficial da ditadura brasileira, bem como das ditaduras da Argentina e do Uruguai’, além disso, as Comissões da Verdade, espalhadas por todo o continente, já publicaram os seus relatórios “finais”, a nossa Comissão da Verdade, “atrasada” se comparadas a outros países da América Latina, também havia sido publicada. Nesse sentido, a extensa produção autobiográfica, característica da época em questão, possui relação direta com a abertura e mesmo elaboração desses arquivos. Ao mesmo tempo em que o volume de produções sobre memória testemunhal aumentou, e aqui está o cerne da contradição, também expandem-se as relativizações sobre essas narrativas. A medida em que o número de relatos materializados aumenta, a relação que estes possuem com a expectativa de verdade pelos leitores e, ou, consumidores é abalada. Nosso objetivo é então entender esse abalo a partir da elaboração presentificada do passado nas escritas autobiográficas, e questionar quais foram as mudanças e/ou permanências na sociedade brasileira que estão na trama processual de causa e consequência desses abalos dessa relação.
Palavras-chave: Autobiografia. Ditadura Militar. Memória testemunhal.