Na década de 1980, AIDS retomou uma reflexão a respeito da relação social entre a doença e o medo. Fato é que, quando pensamos uma doença enquanto um objeto histórico que também ganha sentido através do medo, percebemos uma tomada de posição política, mas também estratégica, frente a uma ordem vigente de uma dada época. O medo imposto pelas narrativas sobre as doenças por vezes é antecedido, mas também sucedido de outros enunciados que fazem circular estratégias políticas de contenção de comportamentos. Assim, a partir dos discursos sobre sexualidade, através dos escritos sobre AIDS nas edições da Revista Veja, entre os anos de 1983 – 1990, buscamos problematizar as narrativas provedoras de conselhos, advertências e códigos sociais necessários, que foram e ainda são utilizados, não somente para barrar a infestação da doença, mas também para constituição de uma sociedade. Investindo em discurso de medidas de segurança, com discursos destinados a ensinar, educar, prescrevendo regras ideais para um bom comportamento frente a doença, bem como, em regras para uma boa convivência na cidade, o discurso sobre sexualidade passa assumir uma função pedagógica. Com isso, propõe regras e códigos a serem seguidos com base nos comportamentos ditos como perigosos. Colocamos em observação a existência de uma “profilaxia moral” na revista. A narrativa acaba sendo construída de forma que contemple a todos, desde aqueles que não respeitam uma “moralidade”, bem como aqueles que não respeitam as prescrições de saúde. Colocamos em jogo, o quanto os discursos estabelecem fronteiras entre os indivíduos, isso, ao descrever comportamentos que se traduzem em sujeitos que certamente irão padecer por AIDS, cria-se interdições e formas de se viver a realidade da AIDS. De maneira ilustrativa, observamos que em julho de 1983, a Veja expõe a iniciativa de um grupo de psicólogo e sexólogos que culmina na criação de uma rede de atendimento telefônico chamada de SOSsex. Tal rede busca “atender uma população sem dinheiro para frequentar consultórios convencionais”. Um dos sexólogos, José Roberto Paiva, comenta que “Muitas mulheres nunca foram ao ginecologista” e “muitos homens chegam aqui com doenças venéreas sem saber disso”. Tais constatações nos possibilitam a pensar nas formas que os indivíduos da década de 1980 se relacionavam com a temática da sexualidade. Tal rede de atendimento, ao ver da rede estadual, dar clareza do entendimento que em 1983, o Brasil não estava imerso em uma epidemia de AIDS diferente dos Estados Unidos. Contudo, o que chama a atenção não é necessariamente tal constatação, mas sim que o fato, de que embora a não haja uma epidemia da doença, a rede telefônica não parava de tocar, quais fatores então levariam as pessoas acharem que estão com AIDS?
Palavras-chave: Veja. Sexualidade. Discurso. Identidade. Corpos. Discurso.