Zeca Diabo na terra de Odorico – Permanência e tradição teatral na teledramaturgia de Dias Gomes.

Autor(a) principal: Iza Debohra Godoi Sepulveda/ UNEMAT
Co-autor(a): -

O Bem-Amado de Dias Gomes, estreou em 1973 com personagens como Odorico Paraguaçu (Paulo Gracindo) e Zeca Diabo (Lima Duarte) evidenciando os elementos do teatro satírico e da tragicomédia para a teledramaturgia. Não apenas Gomes fez isso, mas pode -se considerar que nessa obra, as relações entre novela/teatro são mais evidentes. Do melodrama às comédias de costume, da sátira ao realismo fantástico, identificamos diversos gêneros dentro da teledramaturgia. Uma das principais referências historiográficas da teledramaturgia no Brasil, alicerça seus marcos na ruptura entre o melodrama de Glória Magadan e o realismo fantástico de Gomes. Entretanto, ao observarmos tais marcos, vemos também que trata-se de opções estéticas dos autores, no qual tal transição talvez esteja mais ligada as correntes teóricas dos autores do que propriamente, de um rechaço as produções anteriores, inclusive porque as produções em série de telenovelas, em especial na Rede Globo de televisão, circulam e mesclam, sem haver um abandono total nem de um gênero, nem de outro. Entende-se que a tradição teledramatúrgica no Brasil se consolidou a medida em que ocupou o lugar da cena teatral para as massas. Intelectuais que consideraram as novelas como mera produção mercadológica, ignoraram um núcleo e um projeto estético dessas novelas. O que circunda a obra de Gomes, vincula-se mais ao projeto de arte e cultura popular e as formas que tais obras pretendem ler os problemas estruturais do Brasil, no caso, a luta de classe permaneceu de forma privilegiada do debate proposto pelas novelas, considerando as críticas tecidas às esclerosadas elites agrárias, às novas formas da vida privada pós 1960. O Bem-Amado contempla um debate posto no teatro engajado no Brasil, a preocupação com o público e a função social da arte. O contraste entre as personagens apresentadas nesse resumo, possibilitam a cognoscibilidade da tradição presente nas telenovelas. A construção da personagem Zeca Diabo traz em si recursos estéticos da tragicomédia, se ao mesmo tempo Diabo faz rir por ser o extremo da contradição, o cangaceiro que não quer matar, que tem olhos de matador e voz de viado, revela ao longo da trama os motivos que o levaram ao crime, expõe feridas de uma sociedade latifundiária, capaz de matar um moleque (seu irmão) por um cavalo. Na mesma vertente, Odorico está no lugar daquele que não quer perder o poder, nem seu status. Caricaturado na figura mesclada do malandro charlatão, ao mesmo tempo que discursa frases que nada tem a ver com seus autores originais, envolve os menos afortunados no seu discurso demagogo, representa a elite esclerosada, que para Gomes estava nos fins de seus dias e teria seu lugar ocupado pelos grupos tecnicistas (O discurso de Lulu Gouveia, à cova de Paraguaçu). Dessa forma, compreendemos que os marcos postos para o entendimento da teledramaturgia no Brasil não considerou de todo que além das rupturas, encontram-se debates que não necessariamente querem romper com o anterior (considerando as relações trabalho de Gomes e Magadan), mas de construir a cena e o lugar das telenovelas como instrumento de transformação social.

Palavras-chave: Teledramaturgia. Tradição teatral. Historiografia. Televisão.